26 de agosto de 2011

A história do mundo – Capítulo 11

COMO NAPOLEÃO DESCOBRIU QUE ERA TRAÍDO
David Coimbra

Foi no Egito que Napoleão descobriu que era um marido traído. Aconteceu logo depois de vencer uma batalha militar. Estava em Gizé. A noite estrelada e profunda do deserto o fazia pensar em Josefina, que deixara em Paris. Sentia ciúmes e, como todo homem que sente ciúmes, precisava falar com um amigo. Chamou um de seus principais generais, Junot, e suspirou:
- Me diga, Junot: você acha que Josefina é fiel?
É claro que esperava que Junot respondesse:
- Fidelíssima. Ela é uma monja!
Mas agora quem suspirou foi o general. Decidiu contar-lhe a verdade, e a verdade era excruciante: Josefina se revelara uma adúltera contumaz e todos em Paris sabiam disso. Junot não parou por aí. Forneceu uma lista pormenorizada dos amantes da mulher do homem mais poderoso do mundo: garotões louros, musculosos e altos, como Napoleão não era. A dor da cornitude devorou as entranhas do conquistador da Europa. Napoleão saiu uivando pelos aposentos, jurou que pediria o divórcio e anunciou que, aos 29 anos de idade, sentia-se um ancião. Sua vida tinha perdido a cor e a graça.
Mas nem o divórcio e nem a senilidade precoce aconteceram. Napoleão era um homem forte. Aos poucos, foi reagindo. E foram duas as principais causas da reação. A primeira era uma causa loira e sinuosa chamada Pauline. O mesmo Junot que revelara ao comandante sua condição de corno notório informou-o de que adejava, entre os 34 mil homens do Exército em campanha no Egito, uma beldade de 20 aninhos que se travestira de soldado para acompanhar o marido, um tenente do 22º Regimento de Caçadores. Napoleão achou a informação interessante. Junot, então, deu um jeito de apresentar-lhe Pauline. Napoleão encantou-se com seu corpo esbelto e curvilíneo e seus cabelos dourados que, segundo se dizia na tropa, eram tão longos que podiam servir-lhe de capa. A próxima medida de Napoleão foi enviar o marido de Pauline para uma providencial missão bem longe dali. O marido foi, Pauline ficou e Napoleão partiu para o ataque.
Pauline fez como a Itália: cedeu.
A segunda causa da recuperação de Napoleão não foi tão empolgante quanto uma loira de 20 anos de idade, mas foi elevada. Chamava-se “Instituto do Egito”, a sociedade que o conquistador fundou para desenvolver as ciências e as artes no país que pretendia dominar. Napoleão adorava o Instituto do Egito e empolgava-se com seus trabalhos. Com bons motivos. Foi o Instituto que, na prática, “descobriu” o Antigo Egito para o Ocidente.
O Instituto do Egito na verdade foi a reunião dos 167 cientistas convocados por Napoleão para participar da campanha no Oriente. Eram engenheiros, arqueólogos, botânicos, matemáticos, artistas, todo um time de sábios chamados os “savants de Napoleão” (savants significa “sábios” ou “estudiosos” em francês).
O que Napoleão pretendia era imitar seu ídolo, o ídolo de todos os militares que um dia sonharam em conquistar o mundo e até dos que não sonharam: Alexandre, o Grande. Em sua longa campanha da Macedônia até a Índia, Alexandre levou filósofos que registraram e refletiram sobre tudo o que viam. Napoleão queria fazer o mesmo. Queria encher de luzes aquela região bárbara do planeta, dominada por mamelucos, e, se possível, desvendar a misteriosa civilização egípcia.
O adjetivo “misteriosa” não foi embutido na última frase por acaso. Até aquela época, 1799, o mundo não conhecia quase nada sobre o Antigo Egito. Simplesmente porque a escrita egípcia, os hieróglifos, ainda não havia sido decifrada. Ninguém sabia o nome dos faraós, as façanhas que haviam cometido ou o significado das pirâmides e das múmias.
Até que um dos soldados franceses descobriu, semienterrada na areia da cidade de Rosetta, uma pedra de granito negro de um metro e 15 centímetros de altura. O soldado, que não devia ser nada burro, percebeu que havia inscrições gravadas na pedra, supôs que aquilo poderia ser importante e avisou seus superiores. Que também não foram nada burros e enviaram a pedra para os savants, então instalados no Cairo, em um salão de um harém. Lugar inspirador, portanto.
Essa estela é a famosa Pedra de Rosetta, que continha inscrições em hieróglifos, grego e copta. De imediato, os cientistas tiraram cópias das inscrições. Uma sorte, já que não muito tempo depois os ingleses atacaram os franceses, Napoleão e a maioria dos Savants voltaram para Paris e a Pedra de Rosetta ficou no Egito. Os ingleses a transferiram para Londres, onde ainda está. Eu mesmo a vi no Museu Britânico.
Quem nunca a viu foi o gênio linguista francês Champollion. Trabalhando em cima das cópias tiradas pelos savants, ele estudou a Pedra de Rosetta durante 20 anos, até que descobriu o significado da escrita egípcia. Um mundo se abriu. Um mundo antigo, da idade da Civilização. Um mundo que ainda vive no mundo de hoje.

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