30 de agosto de 2011

Alagamento em Vila Lângaro

 Depois da chuva de granizo registrada na madrugada desta segunda-feira, por volta das 23 horas uma forte chuva alagou parte da Rua 22 de Outubro. O pequeno riacho não suportou a chuva torrencial e invadiu a rua, transformando em um rio.








29 de agosto de 2011

A História do Mundo – Capítulo 12

OS HÁBITOS DO CROCODILO
David Coimbra
“Falemos agora do crocodilo e de seus hábitos. Esse animal não se alimenta durante os quatro meses mais rudes do inverno. Embora possua quatro patas, é anfíbio. Põe os ovos em terra e ali os choca. Passa fora d’água a maior parte do dia e a noite inteira no rio, porque a água é então mais quente do que o ar e o orvalho. De todos os animais que conhecemos, não há um que se torne tão grande depois de ter sido tão pequeno. Seus ovos não são maiores do que os do ganso, e os animalejos que deles saem são-lhes proporcionais em tamanho. O crocodilo é o único animal que não possui língua, não move o maxilar inferior e é também o único a aproximar o maxilar superior do inferior. Tem garras muito fortes, e a pele é de tal maneira coberta de escamas que se torna impenetrável. O crocodilo não enxerga absolutamente na água, mas fora dali tem a vista muito penetrante. Como vive na água, traz dentro da goela numerosos insetos, que lhe sugam o sangue. Os outros animais e os pássaros o evitam, sendo o troquilídeo (colibri) o único com quem vive em harmonia, devido aos benefícios que dele recebe. Ao sair da água, o crocodilo espoja-se e põe, habitualmente, as fauces às escâncaras na direção de onde sopra o Zéfiro. Entrando-lhe pela boca, o troquilídeo come todos os insetos que se encontram na sua goela, deixando-o aliviado e reconhecido.”
Essa sensacional descrição do crocodilo do Nilo foi composta há cerca de 2.500 anos pelo grande Heródoto, fascinado que estava com todas as coisas que viu em sua viagem pela terra dos faraós. Em seu livro fundador da História, de título, bem, “História”, Heródoto escreveu que se estenderia mais em seus comentários sobre o Egito “por encerrar ele mais maravilhas do que qualquer outro país; e não existe lugar onde se vejam tantas obras admiráveis, não havendo palavras que possam descrevê-las”.
Mesmo não havendo palavras que pudessem descrevê-las, Heródoto gastou milhares delas na tentativa. E obteve bom sucesso, embora, naturalmente, tenha cometido algumas imprecisões. Por exemplo: o crocodilo possui língua, sim, e move o maxilar inferior.
Antes de Champollion fazer sua descoberta revolucionária, Heródoto era a melhor fonte para se abastecer sobre o Egito. Tratava-se de uma testemunha ocular da vida naquela antiquíssima civilização. Heródoto contou muitas coisas interessantes. Tais como: “No Egito, as mulheres vão ao mercado e negociam, enquanto os homens, encerrados em casa, trabalham no tear (…) As mulheres urinam em pé; os homens, de cócoras”. Ou então, a respeito do amor das pessoas por seus animais de estimação: “Se em alguma casa morre um gato de morte natural, o morador raspa somente as sobrancelhas; se morre um cão, raspa a cabeça e o corpo todo. Os gatos mortos são levados para mansões sagradas e, depois de embalsamados, enterrados em Bubástis. Quanto aos cães, são enterrados em suas respectivas cidades, dentro de ataúdes sagrados. As mesmas homenagens são prestadas aos icneumos. Os musaranhos, os gaviões e os íbis de Heliópolis são transportados para Buto; mas os ursos, muito raros no Egito, e os lobos, pouco maiores do que as raposas, são inumados no próprio local em que foram encontrados mortos”.
Viu como o Antigo Egito era interessante? Lá havia icneumos e musaranhos.
Um relato importante de Heródoto é o que revela as minúcias da preparação de uma múmia:
“Primeiramente, extraíam os miolos pelas ventas com um gancho de ferro, e o que não saía assim era tirado com infusão de drogas. Depois, com uma pedra cortante, faziam uma abertura de lado e extraíam as entranhas; e tendo limpado o abdômen, lavavam-no com vinho de palmeira e o aspergiam com estudados perfumes. Enchiam depois a cavidade com pura mirra, cássia e outras essências, e costuravam o corte; e feito isso maceravam o defunto em natro durante setenta dias; não era legal exceder esse prazo. Ao fim dos setenta dias, lavavam o corpo, enleavam-no em bandas de pano encerado e o empapavam de goma, que no Egito é usada em vez de cola. Em seguida punham o corpo numa caixa de madeira com a forma dum homem, fechavam-na e guardavam-na em câmara sepulcral, de pé, encostada à parede”.
Múmias e pirâmides, é no que as pessoas pensam quando ouvem falar no Egito. Múmias e pirâmides. O que são? Múmias são pessoas mortas, pirâmides são túmulos. Portanto, o Antigo Egito só vive entre nós por causa da morte. Porque aquele povo, aquele tipo de pessoas que viviam ao longo do Nilo há cinco mil anos, esses não existem mais. É uma raça desaparecida, que se fundiu com tantas outras na poeira dos séculos. O que continua vivo do Antigo Egito é o que sobrou das suas crenças. Da sua religião. Os egípcios acreditavam que o corpo era habitado por algo parecido com a alma dos cristãos, o ka, e esse ka seria melhor preservado se preservado fosse o corpo. Assim, a mumificação tentava manter íntegro o corpo e a pirâmide lhe fornecia a casa eterna.
Há uma ironia aí. Como já vimos, as religiões só existem devido à morte. Porque a morte ronda o homem, assombra-o e o fascina desde os tempos do primeiro neanderthal. O homem, quando toma consciência da inevitabilidade da morte, não faz outra coisa na vida senão tentar tornar-se imortal. O homem tem filhos, escreve livros, compõe sonatas, pinta quadros e faz a guerra para tentar vencer a morte. E é por isso também que ele funda religiões. As religiões não são nada além da expressão desesperada do homem que quer viver, mas sabe que vai morrer, do homem que não admite que tudo o que ele é, tudo o que ele sente e pensa, que todo o seu universo vá se apagar para sempre, provavelmente sem deixar rastro, sem posteridade, sem maiores lamentações.
Então, ele imagina que existe algo maior e além. Uma vontade externa, uma entidade que não apenas o protege contra a miríade de misérias da vida como dá sentido a tudo que acontece, mesmo que seja ruim, mesmo que pareça não ter sentido. E se a existência tiver sentido, dando sentido também à morte, então o homem se torna imortal. Eis o esforço das religiões. Os egípcios acreditavam que não só o espírito, mas também o corpo do homem continuava existindo depois que o coração parava de bater; os cristãos têm fé na reencarnação e num céu repleto de anjos tocadores de harpa; os hebreus aguardam o dia do Juízo Final em que as almas serão pesadas na balança do Senhor; os muçulmanos torcem para ir para o Sétimo Céu, onde os espera tudo o que lhes é interdito em vida: 72 húris formosas e vinho abundante sem a ressaca consequente. Ao mesmo tempo, os egípcios ergueram pirâmides assombrosas na areia do deserto, os hebreus escreveram um best-seller que atravessa séculos com idêntico sucesso, os cristãos encheram a Europa e as Américas de catedrais e os muçulmanos pontilharam o Oriente Médio com mesquitas. Essas obras são indestrutíveis, seguem intactas por gerações sem fim e, desta forma, fazem com que as religiões alcancem seu objetivo: tornam o homem imortal.
Feita essa digressão, voltemos às múmias e às pirâmides. No próximo capítulo de A História do Mundo.

A mulher do gerente – Parte II

David Coimbra

Lá estava Péricles, suando, aflito, olhando de esguelha para dona Belinha, a vistosa mulher do gerente. Não um gerente qualquer, não: era o doutor Araújo, o seu gerente, e, mais do que isso, o seu técnico no time da firma. Péricles, havia muito, tentava conquistar a confiança do doutor Araújo. Ambicionava o cargo de subchefe de setor e o posto de quarto-zagueiro titular, mas sabia que o doutor Araújo ainda duvidava da sua capacidade. Assim como sua mulher Mariana. Ela também não confiava nele. Desde que aquela loirinha sardenta…

Bem, aquilo já passara. Só que ela não esquecia. Péricles, portanto, tentava desesperadamente reconquistar sua mulher e conquistar o seu técnico e gerente.

Aí aconteceu aquela ligação. Dez da noite, ele fazendo serão e toca o telefone. Péricles atende e uma voz feminina começa a falar todo o gênero de obscenidades. Luxúria. Lascívia. Dissolução. Cabritismo. Tudo o que se pudesse imaginar de libertinagem era sussurrado por aquela voz, coisas que fariam corar a própria Messalina. E era a dona Belinha! Sim, dona Belinha, a mulher do gerente. Ela não se identificou, claro, mas ele reconheceu a voz.
Durante a noite, Péricles ficou tão perturbado que sequer dormiu. Agora, lá estava ela, no escritório. Dona Belinha! Com uma minissaia… Cristo! Amenor delas, ela que vivia usando minissaias estonteantes. Palmo e meio de tecido, não mais. O escritório todo começou a rumorejar. Zumzumzum, viu?, viu?, que pernas! Péricles não olhava. Permaneceu com as vistas baixas, fitando, mas não enxergando, os papéis em sua mesa. Suava. Não via, mas pressentia os movimentos de dona Belinha pela sala, o ondular de suas pernas de abricó por entre as mesas. Ela dobrou à esquerda, à direita, entrou no corredor que levava à mesa dele, e veio. Veio. Veio. Na sua direção! Péricles não sabia o que fazer. Manteve a cabeça baixa. Ela parou diante da sua mesa. Péricles via unicamente uns 15 centímetros das pernas dela, o naco moreno entre a mesa e a minissaia. Hesitava. E suava. Aos poucos, olhou para cima. Viu a região do umbigo, as mãos, os braços, os, oh!, seios pétreos. Finalmente, aterrissou nos olhos. Ela o encarava, divertida.
— Oi, Péricles – cumprimentou, chispas de sol saindo da voz. – Viste o meu marido por aí?
Péricles olhou-a demoradamente antes de responder. Ela sorria, a boca entreaberta, os lábios intumescidos. A própria malícia, dona Belinha. Estava de costas para o resto do escritório, ninguém via aquele olhar. Só Péricles. Era um olhar tão incandescente que Péricles não conseguia falar. Queria dizer que o marido dela, o venerável doutor Araújo, se encontrava na sala dele, como sempre. Mas não conseguia abrir a boca.Acenou com a cabeça, somente: não, não vira o marido dela. Ela passou a língua vermelha e pontuda pelos lábios em forma de coração. Abriu ainda mais o sorriso. Disse:
— Péricles… – só isso, nada mais. E se foi em direção à sala do doutor Araújo. Péricles ficou sentado, nervoso, tremendo.
Não a viu mais, naquele dia. Só, de relance, na hora em que ela e o doutor Araújo, braços dados, foram embora. Péricles ficou trabalhando. Ia fazer serão outra vez. Precisava trabalhar, era verdade, mas, numa gaveta da alma, guardava a esperança de que ela ligasse de novo.
E ela ligou.
Dez da noite, outra vez. Disse o nome dele, entre dentes, e recomeçou com a lambuzeira verbal. Péricles ficou agitado, garganta apertada, olhava para os lados, engolia em seco, até que tomou uma atitude – balbuciou:
— Dona… — num suspiro.
E depois de uma pausa, com voz sumida:
— …Belinha…
Ao ouvir o próprio nome, ela calou. Péricles também. Silêncio. Péricles apertava o fone contra o ouvido, angustiado. Arrependeu-se de ter dito o nome dela. Ela certamente ficara furiosa. Talvez não quisesse jamais ser identificada. Talvez fosse essa sua fantasia – apenas falar, não fazer. Se tivesse ficado ofendida, poderia inclusive comentar algo com o doutor Araújo. O que seria horrível. Péricles queria muito que o doutor Araújo confiasse nele. Queria a vaga de chefe de setor. Queria ser quarto-zagueiro titular. Que arrependimento. Já estava decidido a desligar, quando ela falou.
— Péricles… — foi o que disse, a voz ainda mais cálida. E depois:
— Péricles… — mais quente.
— Péricles… — mais.
— Péricles… — e mais ainda!
Péricles sentiu a cabeça rodando. Ouvir seu nome sendo pronunciado daquela forma, com tanto… calor… amolecia-lhe os ossos, fermentava-lhe o cérebro. Tinha que dizer alguma coisa. Então disse: – Dona Belinha… E ela, ronronando:
— Péricles…
Ele, suspiroso:
- Dona Belinha…
Ela, quase gritando:
— Péricles!
Ele, gritando:
— Dona Belinha!
Ela, aos berros:
— Péricles!!!
Ele, desesperado:
— Dona Belinha!!!
— Péricleeeees!!!
— Dona Belinhaaaaa!
— Péééééricleeeeeees!!!
Marcaram um encontro para o dia seguinte. Porém, mal desligou, Péricles teve vontade de desmarcar. Decidiu, naquele momento: não iria.Não! De jeito nenhum. Iria manter-se determinado como um marido fiel e um funcionário exemplar. Não iria. Não iria mesmo. Ou iria? Bem, isso você vai ficar sabendo na parte final dessa história.

26 de agosto de 2011

A história do mundo – Capítulo 11

COMO NAPOLEÃO DESCOBRIU QUE ERA TRAÍDO
David Coimbra

Foi no Egito que Napoleão descobriu que era um marido traído. Aconteceu logo depois de vencer uma batalha militar. Estava em Gizé. A noite estrelada e profunda do deserto o fazia pensar em Josefina, que deixara em Paris. Sentia ciúmes e, como todo homem que sente ciúmes, precisava falar com um amigo. Chamou um de seus principais generais, Junot, e suspirou:
- Me diga, Junot: você acha que Josefina é fiel?
É claro que esperava que Junot respondesse:
- Fidelíssima. Ela é uma monja!
Mas agora quem suspirou foi o general. Decidiu contar-lhe a verdade, e a verdade era excruciante: Josefina se revelara uma adúltera contumaz e todos em Paris sabiam disso. Junot não parou por aí. Forneceu uma lista pormenorizada dos amantes da mulher do homem mais poderoso do mundo: garotões louros, musculosos e altos, como Napoleão não era. A dor da cornitude devorou as entranhas do conquistador da Europa. Napoleão saiu uivando pelos aposentos, jurou que pediria o divórcio e anunciou que, aos 29 anos de idade, sentia-se um ancião. Sua vida tinha perdido a cor e a graça.
Mas nem o divórcio e nem a senilidade precoce aconteceram. Napoleão era um homem forte. Aos poucos, foi reagindo. E foram duas as principais causas da reação. A primeira era uma causa loira e sinuosa chamada Pauline. O mesmo Junot que revelara ao comandante sua condição de corno notório informou-o de que adejava, entre os 34 mil homens do Exército em campanha no Egito, uma beldade de 20 aninhos que se travestira de soldado para acompanhar o marido, um tenente do 22º Regimento de Caçadores. Napoleão achou a informação interessante. Junot, então, deu um jeito de apresentar-lhe Pauline. Napoleão encantou-se com seu corpo esbelto e curvilíneo e seus cabelos dourados que, segundo se dizia na tropa, eram tão longos que podiam servir-lhe de capa. A próxima medida de Napoleão foi enviar o marido de Pauline para uma providencial missão bem longe dali. O marido foi, Pauline ficou e Napoleão partiu para o ataque.
Pauline fez como a Itália: cedeu.
A segunda causa da recuperação de Napoleão não foi tão empolgante quanto uma loira de 20 anos de idade, mas foi elevada. Chamava-se “Instituto do Egito”, a sociedade que o conquistador fundou para desenvolver as ciências e as artes no país que pretendia dominar. Napoleão adorava o Instituto do Egito e empolgava-se com seus trabalhos. Com bons motivos. Foi o Instituto que, na prática, “descobriu” o Antigo Egito para o Ocidente.
O Instituto do Egito na verdade foi a reunião dos 167 cientistas convocados por Napoleão para participar da campanha no Oriente. Eram engenheiros, arqueólogos, botânicos, matemáticos, artistas, todo um time de sábios chamados os “savants de Napoleão” (savants significa “sábios” ou “estudiosos” em francês).
O que Napoleão pretendia era imitar seu ídolo, o ídolo de todos os militares que um dia sonharam em conquistar o mundo e até dos que não sonharam: Alexandre, o Grande. Em sua longa campanha da Macedônia até a Índia, Alexandre levou filósofos que registraram e refletiram sobre tudo o que viam. Napoleão queria fazer o mesmo. Queria encher de luzes aquela região bárbara do planeta, dominada por mamelucos, e, se possível, desvendar a misteriosa civilização egípcia.
O adjetivo “misteriosa” não foi embutido na última frase por acaso. Até aquela época, 1799, o mundo não conhecia quase nada sobre o Antigo Egito. Simplesmente porque a escrita egípcia, os hieróglifos, ainda não havia sido decifrada. Ninguém sabia o nome dos faraós, as façanhas que haviam cometido ou o significado das pirâmides e das múmias.
Até que um dos soldados franceses descobriu, semienterrada na areia da cidade de Rosetta, uma pedra de granito negro de um metro e 15 centímetros de altura. O soldado, que não devia ser nada burro, percebeu que havia inscrições gravadas na pedra, supôs que aquilo poderia ser importante e avisou seus superiores. Que também não foram nada burros e enviaram a pedra para os savants, então instalados no Cairo, em um salão de um harém. Lugar inspirador, portanto.
Essa estela é a famosa Pedra de Rosetta, que continha inscrições em hieróglifos, grego e copta. De imediato, os cientistas tiraram cópias das inscrições. Uma sorte, já que não muito tempo depois os ingleses atacaram os franceses, Napoleão e a maioria dos Savants voltaram para Paris e a Pedra de Rosetta ficou no Egito. Os ingleses a transferiram para Londres, onde ainda está. Eu mesmo a vi no Museu Britânico.
Quem nunca a viu foi o gênio linguista francês Champollion. Trabalhando em cima das cópias tiradas pelos savants, ele estudou a Pedra de Rosetta durante 20 anos, até que descobriu o significado da escrita egípcia. Um mundo se abriu. Um mundo antigo, da idade da Civilização. Um mundo que ainda vive no mundo de hoje.

A mulher do gerente - Parte I

David Coimbra
Péricles estava fazendo serão. Devia ser umas 10 da noite. O telefone tocou. Estranho, o telefone nunca tocava àquela hora. Péricles olhou para o aparelho. Levantou o fone. Levou-o à orelha.
— Alô?
Então ouviu aquilo. Jesusmariajosé! Nunca tinha ouvido nada parecido na sua vida. Nem nos jogos de futebol da vila. Nem nos bordéis que freqüentara na adolescência. Nunca, jamais ouvira cabedal tão vasto, sortido, rascante e caudaloso de obscenidades. E era uma mulher! Que sabia o nome dele. Pois havia perguntado:
— O Péricles estááá? — assim, com três as. E agora dizia o que queria fazer com certas partes do corpo dele e o que queria que ele fizesse com determinadas partes do corpo dela. Coisas… coisas… coisas gosmentas! Cristo! Logo com Péricles que, está certo, não era nenhum sacristão, já aprontara das suas, mas agora não, agora estava mudado, fazia um ano que só queria saber da mulher dele, fazia um ano que decidira tornar-se um homem responsável, bem casado, sério, honesto e, sobretudo, fiel. E estava conseguindo. Mais um pouco, tinha certeza, e iria reconquistar a confiança quebradiça de sua mulher Mariana. Por isso, Péricles não estava interessado em novas aventuras sexuais, por mais selvagens, enlouquecedoras e melequentas que fossem.
Mesmo assim, não conseguia desligar o telefone. Ouvia embasbacado a voz rouca que lhe sugeria posições de ginasta romeno, locais clandestinos de fornicação, que lhe falava de orifícios dilacerados, seivas escorrentes, fluidos esguichados. Mais: Péricles começava a reconhecer aquela voz. Era sussurrada, sim, baixa, sim, mas conhecida.
Enquanto ela falava e gemia e uivava e rosnava, Péricles foi identificando-a. Quem era mesmo? Quem era mesmo?… Até que reconheceu. E quase gritou, ante à revelação. Dona Belinha! Isso: Dona Belinha, a mulher do gerente! Péricles quase desligou o telefone. Dona Belinha, cruz credo, como ele podia ficar ouvindo aquelas coisas da Dona Belinha? Era mesmo um safado! Imagina se o gerente, o Doutor Araújo, descobrisse. Além do mais, o gerente era mais do que o gerente — era o seu técnico. É. O técnico do time de Péricles na firma.
E Péricles, só Péricles, sabia o quanto trabalhava para conquistar a confiança do Doutor Araújo. Com muita raça, treinamento com bola, abdominais e horas extras ele se transformara em forte candidato ao cargo de subchefe de setor e à posição de quarto-zagueiro titular. Ansiava por conquistar a admiração do Doutor Araújo, tanto quanto almejava voltar aos bons tempos com sua mulher Mariana. Mas o Doutor Araújo ainda o encarava com reticências. Até porque era um momento importante: o time da firma ia disputar a semifinal do campeonato interno. Precisava, portanto, de todo o respeito do Doutor Araújo. Como, então, ele tinha a desfaçatez de ficar ouvindo aquelas sem-vergonhices da Dona Belinha?Péricles começava a se sentir mal com aquilo. Começava a se sentir culpado.
Foi quando uma fagulha de raciocínio trespassou seu cérebro azoinado – ora, era ela quem estava ligando! Ela que era a degenerada! Esse pensamento o tranqüilizou um pouco. Ficou ouvindo as libertinagens e pensando: Dona Belinha, quem diria…
De repente, uma outra voz emergiu do fundo da ligação. Era alguém que chegava ao recinto de onde Dona Belinha falava. Um homem. O Doutor Araújo! Sim, era a inconfundível, sisuda, ordeira e grave voz do Doutor Araújo, a mesma voz que lhe recomendava todos os domingos:
— Bola pro mato, seu Péricles! Não pipoque, seu Péricles!
Ou, às segundas:
— Vamos controlar as ligações telefônicas, seu Péricles, precisamos enxugar despesas, seu Péricles.
O Doutor Araújo era assim, chamava todo mundo de senhor, de “seu”. Era como o velho Foguinho. Grande homem, o Doutor Araújo. E, agora, o Doutor Araújo chegava perto do telefone em que Dona Belinha proferia todas aquelas imundícies. Péricles estremeceu. Será que o Doutor Araújo pegaria o telefone? Falaria com ele, Péricles?
Mas aí, súbito, ela desligou.
Péricles não conseguiu mais trabalhar. Foi para casa. Não conseguiu dormir, também. Ficou apenas pensando na Dona Belinha, nas coisas que ela dissera. Por que fizera aquilo? Será que ela tinha algum interesse nele? Se tivesse… Puxa vida, Dona Belinha era uma linda mulher… Realmente, uma linda mulher. Seu sorriso cândido, seus cabelos esvoaçantes, seus seios pétreos e, principalmente, suas pernas… Dona Belinha usava cada minissaia! Quando ia à firma, e isso acontecia quase todos os dias, os funcionários se perturbavam, não trabalhavam direito, ficavam só olhando de soslaio para as pernas compridas da Dona Belinha.
Dona Belinha, Dona Belinha… Que pernas! O pensamento de Péricles deslizava pelas pernas de Dona Belinha, apalpava-lhe o tornozelo delicado, subia pelas canelas macias, escalava o joelho redondo e já estava alcançando a curva interna das coxas quando a realidade, na forma das sobrancelhas cerradas da sua mulher Mariana, o abalroou. Foi um choque. Mariana pregava em sua testa um severo olhar de reprovação.
— Em que tu estás pensando? — quis saber ela, as mãos na cintura.
Péricles enrubesceu.
— Nada, nada…
— Só pode ser sacanagem!
Como ela sabia? Que coisa. Mariana não confiava nele mesmo. Desde o dia em que a loirinha sardenta… Puxa, mas fazia tanto tempo! Péricles tinha de fazer algo para muar aquela situação. E já.
— É que pensava em nós, Marianinha. — Será que colaria? — Nos nossos bons tempos… — era uma tentativa, ao menos. Ela só balançou a cabeça, negativamente, e se foi, suspirando.

Não colou.

Péricles passou a noite se recriminando: tentava reconquistar sua mulher, fazer com que ela acreditasse que ele havia mudado, que não era mais o vira-latas de tempos atrás, e bastava um telefonema safado para não pensar em outra coisa, só em pernas de Dona Belinha, pernas de Dona Belinha!
E o Doutor Araújo? Como iria provar ao Doutor Araújo que podia ser titular da quarta-zaga e chefe de setor se estivesse pensando nas pernas da mulher dele? Belas pernas, era verdade. Pernas rijas, sólidas como dois troncos de figueira, e ao mesmo tempo lisas, tenras. De cetim. Mas eram as pernas da mulher do gerente! Oh, Deus! A culpa!
De manhã, Péricles foi para o trabalho estremunhado. Sua cara parecia um pastel. Passou o dia distraído, os colegas falavam com ele e ele:
— Ahn?
Até que, no fim da tarde… ela apareceu. Quando a viu, Péricles sabia que ia acontecer algo. Algo grave. Aconteceu mesmo.

25 de agosto de 2011

A História do Mundo – Capítulo 10


HOMENS LIVRES NA ALMA
Akhenaton rebelou-se contra um mundo antigo – o Egito foi a segunda grande civilização da História. Em primeiro lugar surgiram os sumérios; depois, os egípcios. E, como no caso da Suméria, a grandeza do Egito foi forjada ao longo de um rio, o Nilo.
“O Egito é uma dádiva do Nilo”, escreveu Heródoto. E escreveu bem. O Egito vive em função do Nilo e só existe graças ao Nilo. Para compreender como as coisas aconteceram, pense no mapa da África. Ou, melhor, abra o Google Earth. Você verá que o Egito se situa numa das áreas nevrálgicas do planeta, no nordeste do chamado Continente Negro. Note que ali em cima, à direita, bem perto, brame e ruge o Oriente Médio. Lá estão Israel, a Jordânia, o Líbano, a minúscula Faixa de Gaza, todos aqueles lugares pequenos e perigosos. Entre o Egito e essa região trepidante estende-se o Mar Vermelho, o tal que Moisés abriu para que os hebreus passassem. Pensando nesse episódio, na Passagem do Mar Vermelho, você entenderá como o Egito fica próximo da Palestina e de todas aquelas complicações milenares. É possível que você argumente: “Mas os hebreus vagaram 40 anos no deserto antes de encontrar a Terra Prometida, de onde vertia leite e mel”. É verdade, só que eles ficaram 40 anos praticamente andando em círculos, jamais em linha reta.
Sabe por que esse tempo, 40 anos? Não foi por acaso. Foi um período escolhido por ninguém senão o próprio Javé, o deus ciumento, possessivo e vingativo dos hebreus. Javé pretendia purgar o povo dos vícios gerados pelo antigo estilo de vida. No Egito eles eram escravos. Agora, eram homens livres. Para que a Terra Prometida fosse habitada apenas por homens livres também na alma, homens que nunca tivessem sentido o travo da escravidão, Javé fez o povo esperar a extinção de toda uma geração. Quando o último escravo dentre eles morreu, a Terra Prometida foi alcançada.
Muito simbólico, não é? Reflita sobre isso e você entenderá que os traumas de um povo só são encerrados depois de uma geração inteira. Assim ocorreu com os dramas das duas guerras mundiais do Século 20. Só depois de toda uma geração de paz a Europa encontrou a serenidade.
Mas voltemos ao Google Earth. É importante você visualizar essa região do planeta. Os destinos do mundo são traçados ali, e faz tempo isso.
Se você deslocar a visão um pouquinho, da direita para a esquerda, verá a artéria azul do Rio Nilo serpeando pela terra seca. Lá em cima, no Norte, está o chamado “Delta”. O rio vai descendo para o Sul com cidades históricas grudadas ao seu leito: Cairo, Gizé, Luxor… E lá se vai o Nilo, uma tripa de impressionantes 6.700 quilômetros de extensão.
Agora, antes de irmos em frente, há algo que você tem de lembrar sobre o Egito: o Alto Egito fica embaixo e o Baixo Egito fica no alto. É importante mentalizar isso, porque é no Alto Egito, ou seja, lá embaixo, que as coisas começam a acontecer. No Oceano Índico, que está a Leste da África, ocorrem todos os anos as famosas “monções”, que nada mais são além de ventos. Essas monções provocam chuvas torrenciais, que caem sobre o grande afluente do Nilo, na verdade a continuação do rio, chamado de “Nilo Azul”. Então imagine um bloco d’água subindo, ou melhor, descendo do Sul para o Norte, cortando a África, passando por vales, montanhas e selvas, até finalmente desaguar no “Nilo Branco”, que é o Nilo propriamente dito, agora já dentro do Sudão. O volume imenso d’água segue seu caminho e aí surge uma sequência de seis cataratas, da sexta, mais ao Sul, para a primeira, mais ao Norte. A primeira é o ponto onde começa o Egito. Como se fosse o Chuí para o Brasil.
Mas o caminho das águas não se detém na fronteira, segue rumo ao Norte, desbordando das margens do Nilo, porque o leito do rio torna-se pequeno para a parede líquida. E foi isso, essa enchente anual, que construiu o Antigo Egito. Muito antes de a Civilização florescer naquela região, há talvez uns 10 mil anos, os homens já esperavam as cheias do Nilo com a expectativa de um funcionário público aguardando pela sexta-feira. Quando o rio começava a vomitar para fora de suas bordas, os homens recuavam para ondulações do terreno chamadas de “Cascos da Tartaruga”, e lá esperavam. Quando o rio retornava ao seu leito natural, deixava na terra sedimentos ricos, perfeitos para a agricultura. Era um corredor fértil que os egípcios usavam com sabedoria para plantar e sobreviver.
Mas tudo isso acontecia sem muito método, até que, por volta de 5.500 anos antes de Cristo, eles tiveram contato com os sumérios. Os sumérios sabiam das coisas havia muito, muito tempo. Trouxeram com eles bois e vacas, trouxeram variedades novas de trigo e cevada, trouxeram um invento engenhoso, o arado, e outro mais engenhoso ainda, a roda. Trouxeram também a escrita e as técnicas de irrigação.
E assim começou a grande aventura desse povo único, os egípcios.
Sobre o que falaremos mais no próximo capítulo!

A história do mundo – 9º capítulo


O QUE FREUD DIZIA DE MOISÉS
David Coimbra


Freud afirmava que Moisés era egípcio.
Você compreende a dimensão disso? A importância que uma sentença dessas tem para a cultura ocidental?
Vou repetir:
“Freud afirmava que Moisés era egípcio”.
Estou falando de Moisés, o libertador dos hebreus, o fundador do judaísmo. Judaísmo que, não por acaso, é chamado de “a religião mosaica”. Pois Moisés não era judeu.
Freud, que, aliás, ERA judeu, fundamenta essa tese no sensacional livro “Moisés e o Monoteísmo”.
Os argumentos de Freud são muito convincentes, que Freud era um homem convincente. Ele começa analisando o nome de Moisés. Segundo a tradição judaica, Moisés significa, em hebraico, “porque das águas o tenho tirado”. Uma referência óbvia ao mito do nascimento do dito cujo: sua mãe hebreia o teria lançado às águas do Nilo dentro de um cesto bem calafetado com betume e pez, a fim de escapar à perseguição do faraó aos filhos do seu povo. O faraó havia ordenado a morte de todos os bebês masculinos judeus como uma forma um tanto radical de controle populacional dos escravos, que, segundo ele, se reproduziam com preocupante velocidade. O cesto teria sido descoberto por uma princesa egípcia, que se encantou com o pequerrucho e o salvou e o criou como se fosse seu filho. Foi essa princesa quem deu o nome de Moisés a Moisés. Mas, ora, se ela era egípcia, por que daria um nome hebreu à criança que, alegava, era filho de seu ventre?
Arrá!
Freud explica, então, que Moisés é um nome egípcio, que quer dizer, apenas e tão-somente, “filho” ou “criança”. Os egípcios tinham o hábito de pôr essa partícula nos nomes dos filhos. Tipo: “Amon-mose”, significando “Amon-uma-criança”, forma contraída de “O deus Amon deu uma criança”.
O mesmo ocorre com a partícula “son” nos nomes dos escandinavos. Son, você sabe, é “filho”. Logo, Cleberson é o filho de Cléber, Jameson é o filho de James, Roberson é o filho de Robert, e por aí adiante. Visite uma favela brasileira e você vai ouvir as mães gritando:
_ Anderson, Róbson, Wilson, Maílson, Marilson, já pra casa!
É que há muitos escandinavos nas favelas brasileiras.
Mas Freud não se baseou só no nome de Moisés para provar que ele era egípcio. Citou também um caso do qual foi protagonista um velho conhecido nosso: Sargão, o primeiro personagem da História, que, ao nascer, também viu-se acomodado dentro de um cesto e largado nas águas de um rio, o Eufrates, sendo depois recolhido por um homem chamado Akki, “o tirador de água”. O resto da história é um enredo já conhecido.
Freud explica que o mito do nascimento do herói é semelhante em várias culturas. O primeiro talvez tenha sido o de Sargão, mas depois se reproduziu em Moisés, Gilgamesh, Ciro, Rômulo, Édipo, Karna, Páris, Telefos, Perseu, Hércules, Anfion, Zetos…
Mas o grande argumento de Freud, a estocada genial e definitiva é quando ele lança mão da história de Akhenaton.
Akhenaton é o faraó mais intrigante do Egito, porque foi um revolucionário, um rebelde. Naguib Mahfuz, o egípcio que ganhou o Prêmio Nobel de Literatura em 1988, escreveu sobre ele um romance, “Akhenaton, o Rei Herege”. Trata-se de um belo romance. O narrador da história entrevista pessoas que fizeram parte do governo de Akhenaton e conviveram com ele. Moisés poderia ser um dos entrevistados. Porque Freud acredita que Moisés era um sacerdote da religião fundada por Akhenaton, uma religião… monoteísta. A primeira religião monoteísta do mundo.
Trata-se de uma história tão interessante que merece um capítulo exclusivo para ela.
Vamos em frente.
Aguarde.

24 de agosto de 2011

Como surgiram as sílabas

A HISTÓRIA DO MUNDO E O SENTIDO DA VIDA – 8º CAPÍTULO
Por David Coimbra

Pense no pato.
Pato.

Pato, pato, pato.
Agora imagine que você é um sumério vivendo há 5.500 anos sem saber como escrever pato, porque nunca ninguém havia escrito pato antes, mas TENDO que escrever pato para, digamos, registrar a venda de patos para um amorita que adora comer pato, como ele gosta de pato, esse maldito amorita.
O que fazer?
Bem, você sabe, de ouvido, que pato é pá + tô. É assim que se fala pato:
_ Pa… to.
“Pá” você sabe como escrever: é o desenho de uma pá, a ferramenta, coisa fácil. É isso que lhe dá a ideia de usar o desenho que representa uma pá para simbolizar a metade da palavra pato. Agora você só precisa imaginar um símbolo para tô. Embora a gramática ainda não tenha sido inventada, você se lembra da contração da primeira pessoa do singular do verbo

23 de agosto de 2011

Existe amizade entre homens e mulheres?

Costuma-se afirmar que uma amizade não resiste ao amor ou a paixão. Explico: segundo teorias populares uma amizade que vira paixão e/ou amor nunca resiste. Se a paixão for duradoura acaba a amizade e se a paixão acaba a amizade vai por água abaixo.
Há também os que dizem que não pode existir uma amizade verdadeira entre um homem e uma mulher, o que eu discordo, pois tenho várias amigas. Mas acredito na teoria de que uma amizade que vira paixão não resiste ao fim dessa paixão, principalmente se a intensidade da paixão não for tão grande em ambos.
Conta-nos a literatura que

Como foram inventadas as palavras

A HISTÓRIA DO MUNDO E O SENTIDO DA VIDA – 7º CAPÍTULO
David Coimbra

Tempos atrás conheci um cara que era professor de surdos. Ele me contou algo sobre o qual nunca havia pensado: que, para um surdo, é MUITO MAIS DIFÍCIL aprender a ler e a escrever do que para quem ouve bem. Revelou-me, o professor, que não raro um surdo atravessa a existência como analfabeto absoluto.

A informação a princípio me deixou perplexo. Afinal, a leitura é um exercício silencioso. Você não precisa falar ou ouvir para ler. Nem deve. A concentração necessária à boa leitura faz-se na paz e na quietude.

Assim, eu imaginava que os livros eram um refúgio dourado, uma ilha aventurosa para quem não podia ouvir. Ledo ivo engano. Os livros são desafios renhidos para quem tem deficiência auditiva.

Por quê???

Porque nosso sistema de escrita é fonético. Quer dizer: cada letra representa um som. A palavra escrita “casa” reproduz simbolicamente os sons pronunciados: “ca… sa”.

O problema é que, para quem nunca ouviu este som, a palavra “casa” não significa nada. Não passa de um desenho: uma meia-lua crescente, “C”, contígua a uma pequena torre, “A”, grudada a uma serpente, “S”, pegada a outra torre, “A”. Agora, se eu desenhar um quadradinho com um triângulo em cima, todos vão entender que estou representando uma casa.

Um surdo de nascença, para aprender a ler, tem de DECORAR todas as palavras. Você percebe como isso é complexo? Se eu escrever, por exemplo, fuquifúqui, lóqui,...

22 de agosto de 2011

A cidade amaldiçoada e os quatro rios do Paraíso

A HISTÓRIA DO MUNDO E O SENTIDO DA VIDA – 6º CAPÍTULO
David Coimbra

 
Os velhos egípcios orgulhavam-se de ser velhos. O grego Heródoto, que enfiou o nariz curioso nas margens do Nilo há 25 séculos, contou que eles se jactavam de ser o povo mais antigo da Terra. É assim a alma dos povos, cada qual com suas vaidades e suas bazófias, os cariocas e suas praias ensolaradas, os russos e sua literatura sombria, os franceses e sua gastronomia sutil, os alemães e sua filosofia profunda, os austríacos e sua música requintada, os gaúchos e… seu pôr-do-sol.

Pois os egípcios acreditavam ser os pioneiros da Civilização. No reinado do faraó Psamético, nos anos 600 antes da nossa era, essa crença era sólida como as paredes das pirâmides. Até que surgiram uns frígios irritantes afirmando que a Frigia, sim, era muito mais antiga. Discute daqui, discute de lá, Psamético decidiu descobrir quem tinha razão através de prova provada. Tomou duas crianças recém-nascidas, de famílias pobres, e as entregou a um pastor com as seguintes instruções: os nenês deveriam ser criados longe de quaisquer outros seres humanos e o pastor jamais, eu disse JAMAIS!, deveria falar uma única palavra diante deles.
O faraó pretendia, desta forma, estabelecer qual seria a primeira palavra que as crianças falariam, assim que deixassem de emitir sons inarticulados. Para garantir a lisura do experimento, Psamético mandou que seus soldados arrancassem as línguas das mulheres que viviam com o pastor, convencido de que a natureza feminina não suportaria permanecer muito tempo em silêncio, no que, aliás, estava tapado de razão. Ter a língua amputada é chato, mas suponho que as mulheres devem ter entendido as necessidades da ciência.
Bem.
Passados dois anos, o pastor notou que, quando abria a porta e entrava na cabana onde estavam alojados os nenês, eles estendiam as mãos e punham-se a gritar:
- Becos! Becos!
A princípio ele não deu muita importância ao fato, mas como as crianças não paravam de repetir becos, becos, beeecos, o pastor procurou o rei e contou-lhe o caso. Psamético chamou os seus sábios, que os reis sempre tinham sábios a assessorá-los, e perguntou-lhes em qual língua existia a palavra “becos” e o que significava. Depois de uma afanosa pesquisa naqueles tempos sem Google, os sábios o informaram que, .....

19 de agosto de 2011

Do sucesso no comércio ao medo da morte

A HISTÓRIA DO MUNDO E O SENTIDO DA VIDA – 5º CAPÍTULO

David Coimbra

Sabe qual foi a primeira visão que tive de Tóquio?
A primeira cena com que meus olhos redondos de perplexidade depararam quando desembarquei do trem-bala, sabe qual foi?
Japoneses.
As portas automáticas do Shinkansen se abriram, avancei dois passos estação ferroviária adentro e, diante de mim, surgiram milhares de japoneses. Milhares! Japoneses, japoneses, japoneses todos eles. Nenhum ocidental, nenhum negro, nenhuma loira. Só japoneses. Eram eles e eu. Eles japoneses, eu um não-japonês.
Foi uma sensação estranha. Foi como se estivesse em outro planeta. Lembro de ter pensado:
“Mas por que tanto japonês junto?”
Eis o busílis. Eis algo fundamental a se perguntar. Por que razão milhões de japoneses vivem tão próximos uns dos outros? Mas não só os japoneses. Nós todos, chineses que já se amontoam em bilhão e meio, indianos que são um  bilhão e tanto, europeus, americanos, africanos às catadupas por que nos reunimos preferencialmente em cidades? Por que vivermos tão próximos uns dos outros, às vezes em cubos de concreto contíguos, às vezes havendo um vizinho a sapatear dois metros acima, outro a ouvir pagode dois metros abaixo, mais uns quantos assistindo Faustão à esquerda e outros vendo Noroeste de Bauru versus São Caetano à direita, por quê???
Aí está!
Nem sempre foi assim. Nos albores da Civilização, as comunidades eram rurais. As pessoas viviam em núcleos agrícolas, cultivavam a terra, produziam seus próprios alimentos, criavam os animais que lhes serviriam de subsistência e, desta maneira, a vida se arrastava placidamente, como pingos de chuva no telhado.
Até que um dia alguém fez algo diferente. Provavelmente foi um rapaz, um filho de agricultor. Ele descobriu que havia sido agraciado por...

18 de agosto de 2011

Dos hunos brancos a Angelina Jolie

A HISTÓRIA DO MUNDO E O SENTIDO DA VIDA – 4º CAPÍTULO
Sexo é coisa de homem. O que não significa que algumas mulheres não pratiquem o esporte por puro diletantismo. A História esfervilha de exemplos de fêmeas deste quilate. Catarina, “a Grande”, imperatriz de todas as Rússias, era uma. Dizia que precisava cometer sexo pelo menos seis vezes ao dia, senão ficava nervosa. Ninguém queria deixar a czarina nervosa, então os súditos a atendiam com fervor e faziam sexo com ela.
E faziam.
E faziam.
E faziam.
Talvez fosse por isso que a chamavam de “a Grande”.
Outro exemplo cintilante é a greco-egípcia Cleópatra VII, apelidada com carinho de “Cheilon”, que em grego significa “lábios grossos”. Tinha-os grossos e sabia como usá-los, donde o seu prestígio com os romanos poderosos, como Júlio César e Marco Antônio.
O curioso é que a relação não era bem conceituada na velha Roma dos saiotes para legionários. Do ponto de vista de quem praticava, ressalte-se. Quem recebia, gostava, como se constata pela paixão que Júlio e Marco devotaram à rainha, bem como outras centenas (centenas!) de romanos, egípcios, gregos e núbios altos, fortes e espadaúdos que tiveram a sorte de experimentar um pouco das artes labiais da nossa heroína.
A verdade é que práticas sexuais, como quase tudo na vida, mudam de acordo com a cultura. Isso do sexo oral. Os índios brasileiros não o conheciam. Não conheciam nem beijo na boca, e assim os portugueses, beijoqueiros dedicados, eles com seus sonetos melosos de amor é fogo que arde sem se ver e talicoisa, os portugueses fizeram vasto sucesso entre as nossas silvícolas com o cheiro do cravo e a cor da canela, quando aqui chegaram em suas caravelas.
Você sabe, mulher valoriza muito o beijo na boca, assim como valoriza os sapatos de um homem. Quando uma mulher vê um homem pela primeira vez, ela o avalia pelos sapatos que calça. Digamos numa balada: o homem chega e…
Mas estou tergiversando. Voltemos ao sexo oral.
No Brasil de meados do século, o homem que praticava sexo oral...

17 de agosto de 2011

Como foi inventada a monogamia

A HISTÓRIA DO MUNDO E O SENTIDO DA VIDA – 3º CAPÍTULO
Monogamia é coisa de mulher. Mas hoje, você, homem, também se vê obrigado a ser monogâmico. Obrigado, no caso, no sentido moral. Hoje é feio não ser monogâmico. Não pecaminoso, não ilegal, nem mesmo imoral; feio. E de mais não precisa para oprimir e constranger e até mesmo escravizar. Sim, você se transformou em um escravo da monogamia.
Claro que sei que existem homens que são… são… oh, Deus, tremo só de escrever essa palavra, mas escrevê-la-ei ainda assim, em nome da objetividade do texto, para ser bem compreendido pelos meus pudicos leitores, para que a história flua, então, a contragosto digo que sei que alguns homens são… infiéis!
Sério.
São.
Confesso, pejado, que conheço um homem que trai a mulher.
Por Deus, trai.
É horrível, é medonho, mas ele trai. Já o aconselhei a parar com isso, mas não adianta. Ele trai e trai e trai. Tem… amantes. Copula com elas e tudo mais. Deve estar por aí, não duvido que você o conheça. Vendo, você não acreditaria: ele é igualzinho a nós, só que é um adúltero.
Esse meu censurável conhecido, ele não seria censurável tempos atrás. Lembre-se dos primeiros dois ou três milhões de anos da Humanidade, sobre os quais tanto escrevi em linhas passadas. Dois milhões de anos de caça, coleta e festa, em que não havia casamento, família ou propriedade. Dois milhões de anos em que o homem não supunha ter participação na reprodução e em que todos no clã mantinham intercurso sexual sem restrições, vergonha ou camisinha. Ninguém era de ninguém naquele tempo sensato.
Certo.
Vimos que esse período, o da caça e da coleta, foi alterado quando o homem descobriu.......

16 de agosto de 2011

O ócio feminino matou o neanderthal


A HISTÓRIA DO MUNDO – 2º CAPÍTULO
Por David Coimbra



A Natureza trabalhou com afinco em suas tarefas evolutivas até que a espécie humana atingisse o apogeu genético e produzisse a Megan Fox. Mas, biologicamente falando, o homem sapiens sapiens que cem mil anos atrás roncava sobre o solo duro de pedra de uma caverna da Espanha era igualzinho ao publicitário de rabo-de-cavalo que beberica clericot nos bistrôs do século 21. A diferença, portanto, está no espírito, nos costumes, na maneira de viver.
Na cultura.
O que acicatou essa mudança?
O que tornou o homem o que ele é?
Arrá! É aí que voltamos ao nosso amigo neanderthal. Durante milênios, mais precisamente cem deles, talvez 200, não passando de 300, o sapiens sapiens e o neanderthal experimentaram o mesmo estilo de vida. Ambos eram caçadores e coletores. Quer dizer: viviam do que lhes oferecia a Natureza, não produziam nada. O trabalho ainda não havia sido inventado.
Aquele chiste popular, “quem inventou o trabalho não tinha o que fazer”, provavelmente está certo. A invenção do trabalho foi fruto da reflexão, que é fruto do ócio.
Durante mais de dois milhões de anos, porém, o homem não trabalhou. Dois milhões de anos de alegre vadiagem. No máximo, o homem

14 de agosto de 2011

Neanderthal, um solteiro feliz

A HISTÓRIA DO MUNDO – 1º CAPÍTULO

Mas como foi que derrotamos os neanderthais? Trata-se de profundo mistério. Eles tinham tudo para nos vencer. Nós, que digo, somos os sapiens sapiens, os “homens duplamente sábios”. Verdade que fomos nós mesmos que nos pespegamos esse nome, mas, enfim, talvez mereçamos. Afinal, só nós sobramos dentre todas as espécies de homos, os pitecos, os erectus, os habilis e tantos mais. Logo, se o critério for a evolução de resultados, somos mesmo duplamente sábios.
Só que bater os pitecos, os habilis e os erectus foi barbada. Alguns deles se erguiam a pouco mais de metro de altura, a maioria possuía uns cerebrinhos deste tamanho e, o principal, nenhum deles desenvolveu a mais eficiente de todas as ferramentas humanas: a linguagem.
Mas com os neanderthais era diferente.
Com os neanderthais o arroz era mais solto.
Um neanderthal, imagine um vindo em sua direção: não muito alto, mas também não se podia dizer que fosse um Romário: 1m65cm, em média. Forte, retaco e compacto como um buldogue, uns 100 ou 120 quilos de músculos poderosos envolvendo ossos sólidos. Feito um Mike Tyson, só que mais largo e mais baixo. E de pele leitosa – peles claras absorvem melhor os raios de sol, providencial para quem vive em lugares frios como a Alemanha, onde foi descoberto o primeiro esqueleto neanderthal, mas um problema se você precisa viver a vida praiana sob uma canícula de 40°C em Cidreira e não tem sempre à mão o protetor solar fator 60.
Esse neanderthal que avança com resolução ameaçadora para você, ele talvez leve à mão um instrumento cortante, um machado de pedra ou uma lança de sua própria lavra – ele é engenhoso, ele constrói. E o mais relevante: alguns cientistas especulam que o neanderthal sabia falar.
No entanto, mesmo munido de todos esses equipamentos, o neanderthal sumiu. Por 70 ou 80 mil anos, conviveu conosco – os outros homos já haviam se evanescido na poeira dos milênios. Éramos nós e eles, ninguém mais.
Importante: o neanderthal não foi nosso antepassado. Ele era, simplesmente, diferente. Outro tipo de homem, que não foi absorvido, que não se mesclou ao homem moderno; que foi extinto.
Isso é de fato intrigante. O gênero humano existe há bem 3 milhões de anos, ou mais. Mas aqueles antigos hominídeos foram se extinguindo, como se extinguiram os dinossauros, os pterodáctilos e o pássaro dodô. O que me leva a concluir que a extinção de algumas espécies é um processo natural da evolução. Será que devemos tentar mesmo preservá-las? Não tenho certeza a respeito de todas. De algumas, sim. O bacalhau. Dizem que o bacalhau está desaparecendo das águas geladas do Mar do Norte, na branca Noruega. Não quero viver num mundo sem bacalhau. Não quero me contentar com filezinho de cação salgado ao invés do bacalhau à Gomes de Sá.
Seja como for, suponho que algumas espécies tinham mesmo de se retirar do planeta. Como seria o mundo hoje, se todos os tipos de homem tivessem sobrevivido? Como seria a nossa convivência com

12 de agosto de 2011

Séries que eu recomendo

Ao lado coloquei uma lista de seriados que eu recomendo. Esta lista ainda não esta fechada, e provavelmente nunca estará, mas estou procurando links para que possam assistir on line os seriados que eu recomendo. Para que possa assistir basta acessar o link da série desejada e asssistir on line. Se você tiver instalado em seu micro o Real Player, conseguirá fazer o download dos episódios.
Até breve, com mais links de séries.

Decisão do STF sobre nomeação em concurso deve reduzir ações judiciais

O entendimento inédito do Supremo Tribunal Federal (STF) de que o aprovado em concurso público dentro do número de vagas tem direito a nomeação foi comemorado por advogados do setor ouvidos pelo G1. Para os especialistas, a decisão traz mais segurança para os candidatos e diminuirá o número de ações para garantia da posse.
O STF julgou um recurso extraordinário na última quarta-feira (10) em relação a um processo em que o estado de Mato Grosso do Sul questionava a obrigação da administração pública de nomear candidatos aprovados para o cargo de agente auxiliar de perícia da Polícia Civil. A decisão causou repercussão geral, portanto, a interpretação terá de ser seguida em todos os processos que envolvem essa questão.
O advogado especializado em concursos Sergio Camargo diz que essa percepção do STF é inédita. “O Superior Tribunal de Justiça já vinha tendo decisões nesse sentido. Os tribunais vão questionando até chegar ao STJ, que entende que existe direito a nomeação, mas até agora o STF não tinha se manifestado. No caso do Mato Grosso do Sul, o recurso caiu no STJ e depois chegou ao STF, que deu razão ao primeiro”, explica.
De acordo com Camargo, a decisão vira precedente para outras decisões porque tem efeito vinculante vertical, ou seja, a jurisprudência do tribunal superior passa a valer para as outras instâncias.
“Aí a tendência é diminuir os questionamentos [referentes a direito de nomeação] porque é sabido que se bater no STF, o direito à vaga é garantido. Isso facilita a vida do candidato. Além disso, o tempo de julgamento vai diminuir bastante, os juízes vão observar o que o STF já decidiu e vão decidir como o Supremo”, diz.
De acordo com Camargo, o número de vagas previstas na carreira já está previsto no orçamento, mas, muitas vezes, o governante pega essa verba e, por meio de decreto, manda o dinheiro para outro destino.
Para Alexandre Lopes, especialista em direito do Estado e administrativo, a decisão do STF era esperada há muito tempo. “O STJ vem tendo esse entendimento desde 2002 de que candidato aprovado dentro do número de vagas tem direito à posse, mas o STF entendia que os aprovados tinham mera expectativa de direito, e não direito líquido e certo de serem nomeados”, diz.
Lopes também considera que as demandas judiciais deverão diminuir e as instâncias inferiores deverão respeitar o entendimento do Supremo. “As instâncias inferiores já devem seguir o entendimento do STF e isso acelera um eventual processo contra a administração pública”, diz Lopes.
“Apesar de já haver um entendimento do STJ nesse sentido, às vezes a administração ganhava em instâncias inferiores e o candidato tinha que levar sua ação até o STJ. Há anos que o STF não enfrentava essa ação e foi ótimo que foi julgado lá”.
Para Lopes, os órgãos vão passar a respeitar mais a nomeação dos aprovados porque não vão querer assumir o risco de perder as ações judiciais. “Dá estabilidade e mais tranquilidade para o candidato porque cai o mito de que a administração pode fazer concurso e não chamar os aprovados”, diz.
Cadastro de reserva
Lopes ressalta que o entendimento do STF é válido para vagas previstas no edital e não inclui concursos para cadastro de reserva.

“A administração tem expectativa de vacância e por isso faz concurso para cadastro de reserva, aí o aprovado vai sendo convocado conforme as vagas vão surgindo. Mas no caso de terceirizados que exerçam funções no lugar dos classificados em cadastro cabe pedir na Justiça a retirada desse terceirizado e colocar o aprovado”.

De acordo com Lopes, o candidato que se sentir prejudicado deve continuar entrando com mandado de segurança preventivo até 120 dias antes do término da validade do concurso para obter liminar que garanta sua nomeação. Cabe ainda mandado de segurança no prazo de 120 após a validade da seleção.
Número menor de vagas
Sylvio Motta, especialista em direito administrativo e constitucional, considera que a administração pública ficará mais conservadora em relação à abertura de vagas. “Se antes os cálculos de vagas eram feitos por estimativa, agora será fruto de um estudo mais detalhado, com isso teremos alteração no número de oportunidades, pois o estudo vai demandar um critério mais preciso do número de vagas que são necessárias para aquele cargo”, diz.
Do ponto de vista do candidato, Motta considera que a decisão traz segurança. “Esse entendimento vai resolver uma série de pendências judiciais e traz segurança política e jurídica de acesso à vaga”, diz.
Para ele, haverá diminuição no número de vagas. “Mas em compensação elas serão preenchidas”, afirma.
Motta considera que o recurso extraordinário julgado pelo STF produz o mesmo efeito que o de uma lei sobre o assunto aprovada pelo Senado.
Fonte. G1